Biomedicina - Amostras de vida a 80 graus negativos

12.º Ano BIOLOGIA - III. Imunidade e Controlo de Doenças

Investigação biomédica do futuro
Amostras de vida a 80 graus negativos
19.10.2008 - EXPRESSO.PT | Nelson Marques
Texto publicado no 1º Caderno do Expresso de 18 de Outubro de 2008

Primeiro biobanco com amostras de sangue, saliva, urina, massa cerebral e outros tipos de tecidos e extractos moleculares para investigar doenças avança em Lisboa.

Alberto Frias

Investigador português Tiago Outeiro vai liderar o organismo que fica com as amostras recolhidas

As arcas frigoríficas do Instituto de Medicina Molecular (IMM), em Lisboa, preparam-se para receber as chaves que irão abrir as portas da investigação biomédica do futuro. Vai ser a uma temperatura de 80 graus negativos que serão criopreservadas as amostras biológicas do recém-criado biobanco do instituto, o primeiro em Portugal. O projecto, aprovado na semana passada pela comissão de ética do Hospital de Santa Maria, ao qual o instituto está associado, deverá ganhar forma nas próximas semanas, podendo servir os trabalhos de investigação de cientistas de todo o país.

"Serão amostras de sangue, plasma, saliva, urina, osso, líquido cefalo-raquidiano, neoplasias, massa cerebral e outros tipos de tecidos e extractos moleculares provenientes de pessoas com doenças que pretendamos estudar, bem como de outras saudáveis, para permitir fazer comparações, anexadas a uma base de dados que inclui a informação clínica e biológica dos dadores", explicou ao Expresso o director da estrutura, o jovem neurocientista Tiago Outeiro. O objectivo, sublinhou Outeiro, não é armazenar amostras mas antes apoiar o desenvolvimento de estudos que visem "melhorar a prevenção, diagnóstico e tratamento de diversas doenças". "Queremos ter um grande número de amostras, representativas da população, mas o banco só fará sentido se tiver capacidade para as distribuir pelos grupos que fazem investigação relevante. Tem que haver um grande 'entra e sai' de amostras para o banco ser realmente útil".

A concretização do biobanco irá, segundo Tiago Outeiro, facilitar a realização de estudos que só são possíveis se os investigadores tiverem acesso a um número alargado de amostras biológicas. "Por exemplo: como é que posso perceber se a cafeína tem alguma relação com a doença de Parkinson? Só se tiver acesso à informação sobre os hábitos alimentares de um número muito alargado de pessoas e se depois puder perceber se aquele grupo de pessoas que toma café tem uma incidência menor de Parkinson", exemplifica o investigador, que se tem dedicado ao estudo das doenças neurodegenerativas. Por isso, o projecto deverá integrar um inovador banco de cérebros doados para investigação, algo que, garante Outeiro, não existe ainda em Portugal, mas "faz imensa falta" para a investigação em neurociência. "É uma iniciativa complexa, pois implica toda uma logística montada para efectuar a recolha do cérebro poucas horas depois da morte e toca em aspectos éticos complicados, mas é essencial".

As amostras do biobanco serão recolhidas por clínicos das mais diversas áreas, sobre temas em que exista interesse de investigação, "como, por exemplo, nas doenças neurodegenerativas, ou em oncologia, no caso dos bancos de tumores". Para tal, será necessário o consentimento dos dadores, ou seja, estes têm que perceber os procedimentos que vão ser aplicados e os riscos associados. Depois de recolhidas, as amostras serão processadas e armazenadas no biobanco, preservando sempre a confidencialidade do dador.

O banco não se limitará a apoiar as investigações do instituto lisboeta. Qualquer investigador poderá solicitar um conjunto de amostras, devendo, para tal, submeter a sua proposta de estudo à direcção da estrutura. O passo seguinte, admite Outeiro, vai ser a criação de um biobanco nacional. "Será, no fundo, uma rede de biobancos dos diferentes institutos. Há já alguns bancos de tumores em funcionamento, como no Ipatimup - Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Univ. do Porto, ou nos hospitais da Univ. de Coimbra. Em conjunto iremos ser a primeira rede, à qual outros se podem associar".


P&R

O que é e para que serve um biobanco?
O biobanco é um repositório de amostras biológicas e tecidos humanos criopreservados de diferentes indivíduos, apenso a uma base de dados que inclui informação clínica e biológica dos dadores. Tem como objectivo apoiar a investigação dos determinantes biológicos das diversas doenças, podendo acelerar a descoberta de novas técnicas de diagnóstico, fármacos e vacinas.

Que tipos de amostras inclui?
O biobanco do Instituto de Medicina Molecular incluirá amostras de sangue, plasma, saliva, urina, osso, líquido cefalo-raquidiano, neoplasias, massa cerebral e outros tecidos e extractos moleculares.

É necessário o consentimento do paciente?
Sim. Todas as amostras do biobanco terão de ter o chamado "consentimento informado" dos dadores, ou seja, estes têm que perceber os procedimentos que lhes vão ser feitos e os riscos associados. Uma vez no biobanco a identidade do dador é preservada com recurso a um código. Só o director poderá chegar a essa identidade, em casos de necessidade, como seja a descoberta de uma doença que tenha que ser comunicada ao dador.

Quem pode solicitar as amostras?
As amostras do biobanco poderão ser solicitadas por investigadores de todo o país. Para isso, deverão submeter a sua proposta de estudo à direcção do banco, que fará a avaliação do mérito científico do trabalho. Em caso de uma avaliação positiva, as amostras solicitadas serão enviadas para o investigador, que fará o seu estudo, devendo sempre comunicar os resultados obtidos.

Domingo Oct 19, 2008 21:37 / netxplica.com

• Página 1 de 1